quinta-feira, 23 de agosto de 2012

"Pinceladas sobre o início do Modernismo..."


Segundo a História da Arte, poderíamos dividi-la em, pelo menos, dois grandes momentos: a Arte Antiga e a Arte Moderna. Isso acontece porque a Arte Moderna, que deu seus primeiros passos lá pelos anos 1850, surgiu com o intuito de romper com todos os padrões consagrados pela Arte Clássica, reavivada pelo Neoclassicismo.
Enquanto a Arte Antiga era a arte da representação, da mimese, da imitação da realidade (os pintores queriam que suas obras fossem confundidas com o real, como uma fotografia), a Arte Moderna não se contentava reproduzir a natureza como se fosse a sua cópia fiel. Queria, sim, evidenciar que se tratava de uma verdadeira “pintura”.
Isso vem indicado em um episódio envolvendo Matisse. Perguntaram-lhe por que ele pintara a mulher de amarelo. Ele desfez o equívoco: “Mas isso não é uma mulher. É uma pintura”.
Sob o aspecto filosófico (da Estética), verifica-se que, até a renascença, buscava-se o “belo ideal” de Platão, ou seja, o belo como algo intelegível, concepção que se alterou com Baumgarten, que passou a se referir ao “belo real”, que está no mundo sensível, volátil, efêmero, mutável, não havendo mais regras para a sinalização do belo, mas apenas a exigência de uma racionalidade dependente de nossos juízos estéticos.
A Arte Antiga e a Moderna se diferenciavam, primeiramente, no que diz respeito aos assuntos de que tratavam. Os neoclássicos se ocupavam da pintura de erudição, intelectual, histórica, extraordinária, acessível, portanto, somente à elite, que se dedicava aos estudos e, portanto, compreendia a História. Era a chamada “arte maior”, que trazia temas religiosos, mitológicos e históricos.
Isso, no entanto, começa a se modificar com o realista Coubert, militante político (republicano socialista) que queria se libertar dos antigos, democratizando a arte e tornando-a mais acessível a todos.
Coubert queria pintar o que era visível, o banal, o comum, o ordinário, algo que todo mundo pudesse ver e compreender imediatamente, sem a necessidade de recorrer ao intelectualismo. Sua pintura não era para a aristocracia, para a burguesia, mas sim para o povo.
Com a sua pintura “popular”, liberta-se do assunto imposto pelos neoclássicos, pintando o que tinha vontade de pintar, inspirado nos jornais populares e nos desenhos simplificados. Abaixo, sua obra “Enterro em Ornans”, de 1850, em que é retratada cena do cotidiano, que ninguém imaginava pintar.


Mas a Arte Moderna se contrapõe à Clássica também no que diz respeito à técnica. Os neoclássicos se dedicavam à pintura acadêmica. Os pintores trabalhavam nos seus ateliês, tentando, como já dissemos, aproximar-se da realidade.
Se Coubert conseguiu romper com os antigos pintando o que bem entendia (liberdade de assunto), os impressionistas abandonaram a técnica, passando a pintar de maneira livre, como bem queriam.
Um de seus maiores expoentes, Monet, abandona os limitados espaços dos ateliês e passa a representar a variação da luz sobre a realidade. Através da pintura, traduz ambientes luminosos, coloridos, tentando passar as sensações da luz. Pinta a natureza não por sua beleza, mas pela sua luz, pois, para ele, o “cenário” pouco importava, debruçando-se apenas sobre a luminosidade que incidia sobre a paisagem.
Na verdade, não se trata de um revolucionário, eis que, em momento algum, ele pretendeu acabar com a técnica acadêmica, em que os pintores faziam suas obras fechados em um ateliê. Quer apenas detectar as variações da luz, que somente poderiam ser percebidas nas áreas externas.
Para captar o efêmero, aquilo que muda o tempo inteiro, precisava de uma nova técnica, muito mais rápida que aquela ensinada nas academias de arte. Necessitava de uma técnica que se traduzisse na “rapidez de execução”.
Para tal, suprimiu os detalhes (olhos, bocas, contornos), delineando silhuetas.  Deixa nas telas marcas de pincel que, além de demonstrarem como o quadro foi feito (processo pictural), não deixam dúvidas de que se trata de uma “pintura” e não de uma fotografia. É o que podemos observar em uma de suas pinturas mais famosas: “Impressão: nascer do sol”, datada de 1873.
 
 

Sua obra é clara libertação dos modelos clássicos, mostrando-se livre para pintar exatamente “como” queria, longe das regras das academias e sem preocupação com os detalhes.
Talvez o mais difícil, no entanto, tenha sido para os artistas conseguirem se libertar da “representação”. Afinal, desde a pré-história, a arte imita a realidade, criando em nossa cultura o que podemos chamar de “costumes visuais”.
O homem acostumou-se com as imitações, acreditando que a arte antiga é que era “normal”. Acreditava que a forma seria a estrutura da pintura, que deveria ser preenchida com as cores. O desenho, portanto, era de primordial importância, e as obras traziam riqueza de detalhes... Para obterem a verossimilhança, os pintores antigos respeitavam as formas e as cores da realidade.
Cèzzane também revoluciona a pintura, sendo responsável pelo rompimento do edifício da representação. Não mexe na forma individual dos objetos, mas altera o sentido global da visão como um todo, mostrando mais de um ângulo de visão em uma pintura só.
Evidentemente, sua pintura é mais completa que a do mundo real, porque nossos olhos não vêem os objetos de dois ângulos distintos (ou vários) como a pintura consegue nos mostrar.
Isso fica claro na obra “Natureza-morta com maçãs de laranjas” (1895-1900), em que o pintor não usa as noções tradicionais de perspectiva, criando as noções de mais perto e mais distante através da própria cor.
 
 
Por sua vez, Van Gogh tem outra ideia fantástica. Ele sim mexe na forma individual dos objetos. Sua igreja gótica parecer desarticulada, desestruturada, como se estivesse se desfazendo, "derretendo". Abaixo, a obra "Igreja de Auvers", de 1890.

 




O pintor simplesmente deforma os objetos, desrespeitando a forma “imposta” pelos antigos e passando a sensação de “anormalidade”, fugindo às regras da verossimilhança. Ainda, simplifica a paleta de cores sem se preocupar se a cor corresponde ou não àquilo que vimos na natureza. Segundo o artista, a cor não passa de um elemento expressivo, de linguagem, como no “Quarto em Arles” (1888).

 

Assim, fica claro que os artistas modernos, distintamente dos antigos, vêem a Arte Moderna como uma forma de expressão, que se encontra justamente nas diferenças entre a realidade e a obra de arte. 
Van Gogh, evidentemente, não foi compreendido em sua época, pois a sua pintura fica mesmo no limite entre aquilo que é visível e aquilo que nós nunca vimos, nem nunca veremos. Trata-se do que chamamos “especulação sobre o invisível”.
Poderíamos dizer que Monet e Coubert, de maneiras distintas, pintaram aquilo que eles viam. Cèzzane, por sua vez, pintava o que via, mas sobre várias perspectivas, podendo-se afirmar se tratava de uma pintura do pensamento. Por sua vez, Van Gogh pintava o que ele estava sentindo, ou melhor, o que pretendia expressar.
Assim, a pintura moderna passa a ser subjetiva, rompendo com as regras acadêmicas, com as imitações e com o objetivismo dos antigos, libertando-se do passado e trazendo uma nova forma (a priori, rechaçada) de ver o mundo.
Sob a ótica da Estética, o artista passa a ser visto como um gênio, como um criador, a partir do romantismo alemão. Passa a expressar algo que ninguém consegue. Retrata a sua época porque apreende a sua idéia, o seu significado. O artista é justamente aquele que visualiza e transforma o que ninguém vê, mas está aí. 
Evidentemente, essa quebra dos padrões antes impostos causou duras críticas. De fato, era extremamente difícil a adaptação do olhar humano ao novo. Os críticos e os burgueses não estavam acostumados com a nova arte, que lhes parecia de mau-gosto. 
O fato é que, com o advento da fotografia, do que valia simplesmente reproduzir a realidade? O que era mais rico em termos artísticos? Pintar o que existia, concretamente, o que todo mundo poderia ver, imitar perfeitamente da realidade, ou pintar aquilo que nunca vimos e que nunca veríamos se não fosse pela imaginação do artista?
Os artistas modernistas, sem dúvida alguma, têm muito a nos ensinar, pois, em um momento crucial da história arte, quando se acreditava que a pintura havia morrido, deram nova vida e significado à Arte. Por isso, não tenho vergonha de admitir que o Modernismo se tornou meu movimento preferido.
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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